quarta-feira, 28 de julho de 2010

OCUPAÇÃO DA USINA DARDANELOS: GRITO AOS SURDOS

Para entendermos o que levou um grupo de indígenas de onze povos a ocupar as instalações da UHE Dardanelos, município de Aripuanã (MT) é necessário um olhar sobre o processo que culminou na efetivação da obra após vários questionamentos, inclusive dos ministérios Público Estadual e Federal através de ações julgadas em tempo recorde que favoreceram os grupos ditos empreendedores.
Então vejamos: em agosto de 2003, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) atribui a então Fundação Estadual de Meio Ambiente (Fema) a responsabilidade de elaborar o licenciamento da hidrelétrica. Em dezembro do mesmo ano a Fema emite o termo de referência para os estudos ambientais. Em abril de 2004 os grupos Odebrecht e Eletronorte firmam a parceria e este consórcio entrega em dezembro o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental, EIA/RIMA. A mesma Fema convoca para o dia 20 de maio de 2005 uma audiência pública que é cancelada por uma ação do Ministério Público Federal em que se questiona a competência da Fema e Ibama de licenciar a obra.
Uma informação importante sobre a Fema, hoje extinta, é que o órgão estadual foi seriamente abalado quando seu então presidente foi preso na conhecida Operação Curupira, desencadeada pela Polícia Federal, que investigou a emissão de falsos licenciamentos para ‘legalizar’ madeiras. Alguns funcionários do Ibama também estavam envolvidos e foram igualmente presos. A relação promiscua, portanto, não se restringia aos licenciamentos para a construção de hidrelétricas. Bem se faz lembrar que a frente do governo estadual estava Blairo Maggi, motosserra de ouro ‘convertido’ ao neoambientalismo verde e que além do agronegócio se envereda pelo mercado de geração de energia.
Extinta a Fema, foi criada a Sema, Secretaria Estadual de Meio Ambiente. Esta secretaria em agosto de 2005 convoca nova audiência pública sobre Dardanelos. O Ministério Público Estadual entra com uma ação para o cancelamento da mesma, questionando o estudo realizado e apontando falhas na divulgação da audiência. Com o indeferimento da ação a audiência se realiza. O Ministério Público Estadual entra com outra ação pedindo a invalidação da audiência e questionando o EIA/RIMA. É concedida uma liminar e a Sema paralisa a análise técnica que estava realizando para conceder a licença prévia. Com a rapidez esperada por muitos em processos que adormecem há anos, a liminar é derrubada em outubro e já em 7 de dezembro a Sema concede a licença prévia. Através de ação conjunta, os ministério Público Estadual e Federal pedem o cancelamento do leilão previsto e, mais uma vez, questionam o EIA/RIMA, além de apontarem para a precariedade do processo de licenciamento prévio. Dardanelos não foi a leilão naquele momento, mas a Sema prosseguiu seu trabalho para “equacionar” os condicionantes da licença prévia e a Assembléia Legislativa de Mato Grosso, desconsiderando as ações e todos os questionamentos à obra, aprovou o licenciamento concedido pela secretaria.
Estes fatos já seriam suficientes para comprovar o quanto Dardanelos está sendo efetivada ‘a toque de caixa’ das empresas em conjunto com o governo estadual, que sobre todos os direitos querem, a todo custo, impor sua vontade; mas não finda aí. Além da pendente ação impetrada pelo Ministério Público Federal outras questões foram escanteadas.
O povo Arara do Rio Branco, que comprovadamente habita há séculos a região e que conseguiu, após muitos anos, demarcar seu território em Aripuanã vem freqüentemente questionando a construção desta hidrelétrica sobre um lugar que lhes é sagrado. Nesta região, que ficou fora da demarcação, localizava-se um antigo cemitério do povo que foi literalmente sendo implodido no processo de construção. A empresa construtora se negou a dar acesso aos indígenas para que tivessem mais informações sobre este local, embora os documentos e questionamentos feitos por estes. Independente dos fatores determinantes para que este lugar tenha ficado fora da demarcação, o fato é que ele é sagrado para os indígenas, significado que a racionalidade economicista dos ditos empreendedores não alcança, pois não considera outra coisa senão a possibilidade de lucros.
Com o desvio do rio para abastecer a geração de energia, saltos como a Cachoeira das Andorinhas e um longo trecho do rio ficará praticamente seco. Os Arara ficarão sem um de seus lugares de referência e outros povos também serão afetados, já que, com toda a tecnologia, ainda não é possível enviar a energia produzida por e-mail, assim, por onde passará as linhas de transmissão que levarão esta energia para outras regiões? Estes impactos não foram levantados no EIA/RIMA. Outro fato de extrema importância é que, nas projeções da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) nas bacias do rio Juruena e do rio Aripuanã estão previstas, contando com as já instaladas, mais de cinqüenta unidades geradoras de energia, entre as chamadas pequenas centrais hidrelétricas e outras maiores como Dardanelos. Assim, embora no momento se foque esta hidrelétrica, outras tantas integradas deverão impactar povos indígenas e outras comunidades, de forma ainda não estudada ou realmente prevista.
Como verdadeiros predadores sobre a natureza transformada em mercadoria-energia, os ditos empreendedores se lançam sobre os rios onde só enxergam os ‘potenciais energéticos’. Belo Monte, Tapajós, Jirau, Santo Antônio, Dardanelos, Faxinal, Maggi I ou as inúmeras PCHs, não importa o nome. O importante para este seguimento emergente na exploração dos recursos naturais é como transformar, a partir de recursos públicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), água em energia elétrica, esta em mercadoria e, por fim, em riqueza apropriada por alguns. Os povos indígenas, ribeirinhos, trabalhadores e a natureza são apenas algumas peças na imensa engrenagem que são, quando necessário, descartadas.
As empresas, muitas vezes criadas em consórcio com outras, como acontece com a Águas de Pedra, são o exemplo de como a geração de energia é um ótimo negócio atraindo investidores de várias partes do mundo, como acontece com a espanhola Iberdrola, acionista da Neoenergia, que detém 51% da Águas de Pedra. A Iberdrola obteve em 2009 um lucro líquido de nada menos que 2,9 bilhões de euros. As outras empresas que formam o grupo são a Eletrobrás e a Chesf, que juntas detém 49% da Águas de Pedra – 24,5% cada uma. Em outras palavras, os interesses são muitos sobre este mercado.
Quando povos indígenas se juntam, portanto, além do exemplo de solidariedade que dão ao se unirem aos ‘parentes’ com os quais outrora tiveram conflitos, configuram uma das mais belas lições de resistência ao modelo de desenvolvimento que só tem favorecido a acumulação do capital por alguns grupos enquanto aos demais seguimentos sobram as migalhas das pseudo compensações. Este capítulo da história, aliás, é um dos mais terríveis, pois enquanto os povos indígenas diziam não aos empreendimentos, as empresas, por vezes acompanhadas por funcionários do órgão indigenista federal, só argumentavam a partir das ditas compensações. Talvez continuem com a mesma estratégia, chamando grupos indígenas para reuniões em hotéis nas cidades, como fizeram recentemente em Primavera do Leste, não esclarecendo os reais prejuízos que os povos e comunidades terão e ‘pagando’, com recursos públicos, o impagável.
Em outros momentos poderão oferecer o que já é de direito, como assistência à saúde, educação, melhorias em escolas, estradas ou outras ações que são de competência e obrigação do poder público. Como grupos privados podem ‘compensar’ os danos causados por seus atos com ações do Estado? Sabe-se que a saúde, a educação e outros direitos dos povos indígenas estão longe de serem efetivamente respeitados. Contudo, cabe ao poder público respeitar as leis que já vigoram efetivando estes direitos.
Permanece, inclusive nos meios de comunicação, a divulgação de parte da história pintando uma imagem distorcida em que os indígenas só aparecem como um grupo que está atrás de dinheiro enquanto o principal não se enxerga ou se faz questão de não ver.
Somamos nossa voz ao grito dos povos indígenas e com eles gritaremos “até que as pedras erguidas em muros de falsas notícias desmoronem e surja, brilhante e límpida, a verdade nua e clara como as águas dos rios não cativos”.

Fonte: Gilberto Vieira dos Santos
Conselho Indigenista Missionário – Regional Mato Grosso

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Acampamento Terra Livre 2010

Definidos data e local para Acampamento Terra Livre 2010
Durante reunião com lideranças indígenas essa semana, em Brasília, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) avaliou os avanços do movimento indígena nacional e definiu a agenda do Acampamento Terra Livre 2010. O evento deste ano acontecerá em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, entre os dias 16 e 20 de agosto.
O evento, que ocorre uma vez a cada ano, tem por objetivo promover um debate sobre a questão territorial dos povos Guarani Kaiowá e Terena, no MS. Durante o encontro, também serão discutidos temas, como a criminalização dos povos indígenas do nordeste do país, o agronegócio, a extração de madeiras e minérios e os grandes empreendimentos previstos pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), como a hidrelétrica de Belo Monte.
O Acampamento Terra Livre é uma oportunidade para os povos indígenas se posicionarem, expressarem sua opinião e, principalmente, tentarem um novo diálogo com o governo sobre essas temáticas, uma vez que não tiveram seus direitos à consulta prévia, garantidos pela Constituição Federal, Convenção 169 da OIT e a Declaração da ONU dos Direitos dos Povos Indígenas, respeitados.

Acampamento Terra Livre
O Acampamento Terra Livre acontecerá em Mato Grosso do Sul, região do país onde se concentra o maior índice de violência contra os indígenas. Somente no ano passado, 33indígenas foram assassinados no estado, de acordo com o Relatório de Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil – 2009, divulgado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
A situação de violência no MS está diretamente ligada aos conflitos pela posse da terra. De um lado estão os grandes lafundiários, donos de lavouras de soja, cana de açucar e grandes criações de gado. De outro, diversas comunidades indígenas que reivindicam a posse de suas terras tradicionais.
Os conflitos fundiários e as violências cometidas contra os Guarani, caracterizada por racismo institucional pela pesquisadora Iara Bonin e por genocídio pela professora da PUC/SP, Lucia Helena Rangel, desencadeou a transferência do Acampamento para o estado.
Os Guarani são a segunda maior população indígena do páis. No estado vivem cerca de 45 mil indígenas dessa etnia, sem contar com os Terena, Kadiwéu e Xinikinawa, entre outros. Essas comunidades vivem confinadas em pequenas porções de terras ou simplesmente acampadas á beira de estradas da região.

Mobilização contra Belo Monte
Antecedendo o Acampamento Terra Livre, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) promoverá um encontro para mobilizar os povos indígenas da Bacia do rio Xingu contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte. O evento será realizado entre os dias 9 e 12 de agosto, em Altamira, no Pará.
As lideranças indígenas de todos os estados da Amazônia serão convidadas para participar do evento. De acordo com Marcos Apurinã, da Coiab, eles irão apresentar os problemas e desafios vividos por seus povos, mas tendo como ponto central as questões relacionadas a Belo Monte.
As discussões e encaminhamentos dessa mobilização também serão levados para o Acampamento Terra Livre, em Campo Grande.

Fonte: CIMI

terça-feira, 20 de julho de 2010

E por falar em política, onde anda o Juruna?


A História do Brasil recente é muito curiosa. Personagens aparecem e desaparecem de acordo com os interesses da mídia e dos meios de comunicação. Um exemplo contundente é o ex-cacique e ex-deputado federal Mário Juruna.
"A política é podre" - foi esta a resposta que ouvi do ex-cacique xavante e ex-deputado federal Mário Juruna, 48 anos, em Brasília, ao perguntar-lhe como se sentia afastado do Congresso Nacional, após o término do mandato que conquistara nas urnas do Rio de Janeiro durante as eleições de 82. Para Juruna, que fala com uma certa indignação, a maneira do branco se salvar do sistema caótico que ele mesmo criou seria através de inspiração na estrutura de vida dos índios. "Aplicando a maneira do índio viver no meio civilizado, a vida do branco pode melhorar, pois ele vai deixar de tanta tristeza e maldade" - garante o ex-cacique.
Após o término do seu mandato na Câmara Federal, Juruna conseguiu uma vaga como contratado no Projeto Rondon, segundo ele "ganhando um salário de fome". Mesmo sem mandato, é comum encontrá-lo transitando pelos corredores e galerias do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. "Sinto no direito de cobrar dos constituintes as dívidas para com os índios, já que não estou lá para defender eles" - afirma. Contudo, sua maneira de agir não começou durante a conquista do mandato. Ela vem desde 1945 quando sua tribo teve o primeiro contato com os brancos, através do sertanista Chico Meirelles que, depois de muitas lutas, afirmou: "Esses índios jamais abaixarão a cabeça". E a afirmação virou profecia, pois volta e meia os xavantes estão em Brasília reivindicando das autoridades o que de direito lhes pertence.
Mário Juruna diz que sempre foi muito aventureiro e corajoso. "Não tinha medo de nada" - ele afirma - "Só tive medo quando vi um homem branco pela primeira vez. Tinha 17 anos e nunca imaginava existir outra gente que não fosse índio. Fugi. Passei muito tempo escondido no mato, longe daquela gente estranha. Mas depois recuperei e ganhei força para lutar e defender o meu povo".
O primeiro encontro de Juruna com os brancos deu-se em Couto Magalhães, no Mato Grosso, acima do Rio das Mortes, onde ele nasceu. "Tivemos que mudar para outro lugar" - recorda - "isso para continuar vivo. Meu pai era cacique e falava: se branco vier atacar, foge, atravessa o Rio das Mortes e se defende do outro lado. Mesmo a gente fugindo, o branco transmitiu muitas doenças por nosso povo. Morreu muito índio de sarampo, gripe e coqueluche". Mas chegou o dia em que os xavantes não tinham mais para onde fugir e aí o jeito foi aceitar a "pacificação" do homem branco. Segundo Juruna, ele mesmo participou de muitas picadas na floresta, enfrentando bichos, chuva e sol, noite e dia, em busca de esconderijo. Seu pai sofreu muito e desta experiência o futuro cacique e deputado tirou proveito para não deixar extinguir a sua raça. Uma vez "pacificados", os xavantes tiveram que tolerar a doutrinação branca, a religião branca, os colégios brancos, na aldeia de São Marcos, "no colégio dos padres eu não suportei os castigos" - recorda-se Juruna. - "Nem meu pai nunca me deu castigo, por que os outros haviam de me castigar? Saí da tutela dos padres e fui trabalhar nas fazendas que se instalavam por lá".
"Fiquei de cabelo em pé quando vi o homem branco."
Contudo, ele afirma, o trabalho não era do meu agrado. Não da maneira como era imposto, pois "não passava de trabalho escravo". Assistia com revolta a invasão das terras xavantes, a derrubada de árvores e a chegada do gado bovino, bicho desconhecido para sua gente. Segundo Juruna, ele presenciou fatos tão violentos que demorou a entender o verdadeiro significado da palavra "civilizado". Segundo seu depoimento, "os fazendeiros matavam muitos bois e chamavam os índios para uma festa. A gente acreditava e, quando estava todo mundo reunido, comendo da carne, apareciam jagunços e atiravam na gente. Poucos de nós conseguiam fugir dessa emboscada". Revoltado com a situação, o jovem xavante voltou para sua aldeia com vontade de lutar contra os brancos.
"Os brancos infernizavam nossa vida" - dispara. - "E ensinavam que lutar não era coisa de Deus e que a missão do cristão é pensar no lado espiritual. Mas, para xavante, não vale só a prática espiritual. Os padres falavam que a terra por si só não dava salvação.
Mas, pra mim e pro meu povo, índio sem terra é índio sem vida". E foi assim que Juruna partiu para a cidade, pois "índio não pode viver como bicho no zoológico e nós lutamos para ficar lá, no mato, vivendo à nossa moda. Mas os civilizados infernizaram tanto que a saída oi viver entre eles. Fui aprendendo experiência de branco, vendo o jogo deles. Passei a visitar autoridades em Cuiabá, Goiânia e Brasília, mas só ouvi promessas. Aí comprei o gravador. Toda conversa eu gravava e, se não eram cumpridas as promessas, eu denunciava à imprensa. Foi assim que a causa do índio tornou-se presente na imprensa diária. Mas não adiantou muito, o que mais tem é autoridade sem palavra."

"Fomos obrigados a assimilar a cultura do branco: Futebol"

A iniciativa do cacique passou a incomodar as autoridades que passaram a evitá-lo. Contudo, a imprensa o apoiava e ele insistia: "Falou, tá gravado". E suas denúncias e reclamações extrapolaram as fronteiras nacionais e ecoaram pela imprensa internacional. Em 1979 ele foi proibido pelo governo ditatorial de representar as comunidades indígenas num congresso na Holanda. Ele recorda: "Advogados e deputados verificaram junto ao Supremo Tribunal Federal se havia lei impedindo saída de índio do país. O governo não encontrou meios legais de me proibir e eu fui à Holanda. Quando voltei, fui perseguido e a Funai conseguiu fazer documento onde mandaram meu povo assinar exigindo minha retirada da aldeia. Agora vê só o quanto é sujo esse modo dessas autoridades! O governo foi muito criticado lá fora, mas podia ter sido ainda mais, se eu soubesse melhor as coisas do branco. Naquela época eu conversava muito atrapalhado. Se fosse hoje, podia ter denunciado mais coisas".

Carreira Política

A volta da Europa valeu enorme publicidade, o que fez com que Juruna ficasse sob a mira dos políticos que desejavam convidá-lo para seus quadros de candidatos. O primeiro convite surgiu das fileiras do PMDB, através do deputado pelo Rio de Janeiro Modesto da Silveira. Ele o convidou para ser candidato a deputado federal e não faltou entusiasmo da parte do cacique, cujo posto estava já estava sendo ocupado pelo próprio irmão, na aldeia de São Marcos. Quando preparava-se para aceitar o convite do PMDB, um pastor de Barra do Garça virou-lhe a cabeça para o PDT de Leonel Brizola. "Sai candidato pelo PDT e me elegi" - ele recorda. - "Foi um marco na história do Brasil. Não prometi nada que não pudesse cumprir. Não prometi ponte, nem estrada, nem indústria e muito menos desenvolvimento nas cidades. Minha proposta era exclusivamente a defesa da causa dos direitos indígenas. Fiz denúncias na ONU e na Suíça, em 1984".
A atuação de Mário Juruna ma Câmara dos Deputados foi marcada por muitas controvérsias. Logo, logo confessou-se decepcionado com certas atitudes de muitos políticos que prometiam e nunca cumpriam, a exemplo das autoridades que conhecera quando era um simples cacique xavante. No momento, tem recebido convites para disputar o governo do Distrito Federal, por parte do senador Maurício Correia do PDT. Segundo ele, o próprio Brizola tem insistido para que ele tente a reeleição para a Câmara Federal pelo Rio de Janeiro. No entanto, insiste em salientar a sua decepção com os bastidores da política dos brancos: "Eu, como índio, defendo a sinceridade. Fui acreditar nos políticos e deu no que deu. Nunca esperava me ver nessa situação de amargura". Mas, uma coisa parece certa: Brizola não o decepcionou.
Interrogado sobre qual o político que poderia ser o próximo presidente da república, Juruna afirmou: "Quem pode fazer mudanças neste País é o Brizola. Ele está do lado do povo. Ele é homem de vida sofrida, tem passado de homem do campo. Com ele o País vai andar. O País hoje está parado. Congresso faz muito pouco e o Planalto faz menos ainda.Planalto só que ferrar o povo brasileiro. Autoridade não dá respeito e não pode cobrar moral".
Numa conversa de ping-pong, Juruna respondeu prontamente: Qual o por que da inflação?
Essa inflação é resultado de má administração (e reclamou do salário de Cz$ 59 mil que recebe do Projeto Rondon, dizendo que tem 4 filhos na escola, mais 3 ainda fora dela).

Você não pensa em voltar para a aldeia xavante?
Não. Já tenho minha vida aqui.
Por que a Funai dificulta a saída dos índios da aldeia?
Tem medo do índio denunciar, mostrar a situação em que eles estão passando. Funai não dá assistência.

Qual a diferença entre o Serviço de Proteção ao Índio, criado pelo Marechal Rondon, e a Funai?
O SPI sempre protegeu o índio. Era proibido matar índio, mexer em terra de índio. Depois de 1977, quando criou a Funai, tudo modificou. Piorou muito a situação do índio.

Por que você critica tanto o Romeu Juca Filho (então presidente da Funai)? Ele só quer explorar o índio. Está negociando madeira e minério das reservas sem nenhum direito para os índios. Arrumou prédio da Funai com tapetes bonitos e trouxe pistoleiros do batalhão de polícia do Recife para perseguir índio.
Se você fosse presidente da Funai, o que faria?
Problema do índio é fácil de resolver. Eu percorreria todo o Brasil, conhecendo terra dos índios. Onde não foi demarcado e onde não tem assistência, eu resolvia logo. Tirava os exploradores das reservas e fazia cumprir o Estatuto do Índio. Índio deve governar índio. E a Funai tem recursos suficientes, pois recebe ajuda do Banco Mundial da Vale do Rio Doce e recursos do governo, Mas tem muito branco mamando às custas dos índios.

Tentaram corromper você na política?
É. Teve aquela confusão do Paulo Maluf. Ele queria me dar ajuda para eu votar nele no colégio eleitoral. Mas, como modo de índio é diferente, não aceitei. Mas acabei também enganado votando em Tancredo Neves. Pensei que solução estava nele e no Sarney. Hoje a atitude do Maluf não serve de base diante de tanta corrupção cabeluda vista por aí... Índio não tá costumado com essas coisas.

Fonte: www.mariojuruna.org.br
NOSSO JORNAL - ORGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DOS ECONOMIÁRIOS FEDERAIS DE MINAS GERAIS

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Mulheres indígenas denunciam brutalidade policial na destruição do AIR



- As Mulheres Indígenas do Acampamento Indígena Revolucionário (AIR)
- As Mulheres Indígenas do Foro de Organizações Feministas Latino-americanas y Caribenhas
- As Mulheres Indígenas do Conselho Nacional de Mulheres Indígenas

Vêm a publico manifestar o seu repúdio a truculenta ação ocorrida na manhã do dia 10 de julho de 2010, quando uma violenta, irregular, arbitrária, ilegal e etnocida operação policial a mando do GDF, contando com forças do BOPE, Força Nacional, Policia Federal, Policial Civil, Batalhão de Choque Rotam, PM do DF e Cavalaria da PM do DF, cumprindo solicitação da AGU (Advocacia Geral da União) e da Fundação Nacional do Índio (Funai), atacou o Acampamento Indígena Revolucionário – instalado na Esplanada dos Ministérios, em protesto pacifico contra o decreto 705609, que extingue Postos Indígenas e Direitos adquiridos, e pedindo exoneração do presidente da Funai, Marcio Meira – no amanhecer, enquanto homens, mulheres, idosos e crianças ainda dormiam.
Sem mandado judicial, a operação deixou inúmeros feridos, incluindo duas crianças de 2 e 4 anos, que foram removidas para os hospitais HMIB e HRAN – por conta dos efeitos do gás pimenta. Uma menina de 12 anos foi brutal e covardemente atingida com um jato de gás pimenta no rosto por um oficial do BOPE (o que ficou gravado no celular). Uma militante agredida pelos policiais, grávida de 3 meses, abortou. Uma mãe de família foi arrastada pelas pernas para fora de sua barraca e agredida verbal e fisicamente.
A operação policial destruiu as barracas e recolheu roupas, panelas e comidas dos acampados – o que pode ser caracterizado como FURTO – no intento de dificultar a vida dos manifestantes e forçar sua saída da Esplanada dos Ministérios, pleito do Palácio da Justiça ha mais de seis meses.
Apoiadores ficaram detidos sem acusação, sendo que um desses, gravemente adoentado e precisando tomar antibióticos, teve o seu direito a atendimento médico negado pelo delegado da 5ª DP. Os responsáveis pela divulgação midiática do Acampamento Indígena Revolucionário (AIR), gravando, fotografando e divulgando os eventos, foram os primeiros a ser algemados e detidos, só sendo liberados apos o termino da operação policial – sendo que um desses recebeu sua câmera de volta danificada e sem a fita com o registros das violências que comprometem as corporações policiais envolvidas.
Pelo que foi ouvido de um oficial do BOPE, havia a determinação expressa de que não se filmasse nada. Militantes ficaram detidos sem acusação formal, apoiadores foram ameaçados.
O Governo ilegítimo do DF age como um Estado Policial a serviço do Ministério da Justiça e do Gabinete Pessoal do Presidente Lula, que forçam uma queda de braço com as populações indígenas brasileiras ao se recusar a discutir o fim do decreto e a exoneração de Marcio Meira.
A indígena vitimada por um aborto, provocado pela brutalidade policial, teve a sua condição de gestante negada pelo médico do Hospital de Base por conta da pressão da servidora Joana, da FUNAI – apesar dela contar com exames pré-natais que comprovam a gravidez, o médico se recusou a assinar o laudo. O Instituto Médico Legal encenou uma farsa, com a perícia não fotografando nem relatando os hematomas e demais lesões de um rapaz Tupinambá, ferido e torturado em sua passagem pela 5ª DP, quando – com pés e mãos algemadas – recebeu golpes de cassetete e jatos de spray de pimenta no rosto, a pedido do ouvidor da FUNAI e membro do CNPI (Conselho Nacional de Política Indigenista), Paulo Pankararu, e seu subalterno, Ildert.
O subalterno da FUNAI, usando óculos escuros, boné e casaco, como se fosse um ladrão que quisesse se esconder, assessorava a sanha etnocida dos policiais na 5ª DP, afirmando que as bordunas recolhidas – que são um traço e diferenciação cultural das etnias acampadas – eram porretes comuns (armas brancas), afim de caracterizar uma suposta propensão a violência dos membros do Acampamento Indígena Revolucionário, negando a condição de indígenas aos manifestantes, fotografando apoiadores do AIR que entravam na delegacia como forma de intimidar e confraternizando alegremente com os torturadores.
O ouvidor da FUNAI, ao invés de ouvir as reivindicações dos indígenas – ou ao menos as queixas dos manifestantes nativos, que foram algemados e feridos – se limitava a cruzar os braços e rir com seu subalterno.
Hoje, dia 11 de julho de 2010, está no ar uma nota oficial da FUNAI que nega aos manifestantes do Acampamento Indígena Revolucionário a condição de indígenas, dizendo que não pertencem a qualquer etnia nativa, apesar dos militantes do AIR, em sua grande maioria aldeados, possuírem língua, crenças, cultura e genealogia originárias – além do reconhecimento expresso do órgão, na forma de carteira de identidade emitida pela Fundação Nacional do Índio.
Nós, Mulheres Indígenas do Acampamento Indígena Revolucionário, exigimos do Governo do DF e do Governo Federal a imediata devolução dos pertences apreendidos e total assistência ao feridos na ação policial do dia 10 de julho de 2010. Nós exigimos uma ação responsável por parte do Governo Federal, representados por FUNAI e Ministério da Justiça, no sentido de dar uma atenção especial as reivindicações do AIR, expressas na Carta Aberta ao Povo Brasileiro e nos 11 Pontos do Acampamento Indígena Revolucionário, além das exigências particulares de cada uma das mais de 20 etnias representadas no Acampamento Indígena Revolucionário (AIR) há sete meses.
Nós, Mulheres Indígenas do Acampamento Indígena Revolucionário, exigimos o fim da violência – física, moral e institucional – contra nossos Povos, tanto na Esplanada dos Ministérios quanto nas mais diversas Terras Indígenas (Tis) do Brasil.

Fonte: Acampamento Indigena Revolucionário
http://acampamentorevolucionarioindigena.blogspot.com/

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Cimi lança Relatório de Violência Contra Povos Indígenas no Brasil‏


Violência contra os povos indígenas: índices continuam alarmantes
Cimi lança Relatório de Violência Contra Povos Indígenas no Brasil. Dados são referentes a 2009
São 60 casos de assassinatos, 19 casos de suicídio, 16 casos de tentativa de assassinato, e a lista não pára. Estes são apenas alguns dos críticos dados que serão apresentados pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) através do Relatório de Violência Contra Povos Indígenas no Brasil - 2009. Muitas informações se igualam às do relatório de 2008, o que não diminui a gravidade da questão, pois a repetição de números apenas confirma o cotidiano de violência vivido por povos indígenas em todas as regiões.
No dia 9 de julho, o Cimi apresenta mais um alarmante relatório sobre as violências sofridas pelos povos indígenas no país. O lançamento da publicação será na sede da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), às 15h, com a presença do secretário geral da CNBB, dom Dimas Lara, da doutora em Antropologia pela PUC-SP, Lúcia Helena Rangel - que coordenou a pesquisa -, do presidente e vice-presidente do Cimi, dom Erwin Kräutler e Roberto Antônio Liebgott, e do conselho da entidade.

Violências diversas
Como ressalta em seu texto de apresentação, Roberto Liebgott coloca que o Relatório vem mostrar "a omissão como opção política do governo federal em relação aos povos indígenas". Tal atitude implica em diferentes formas de violências, como a não demarcação de terras, falta de proteção das terras indígenas, descaso nas áreas de saúde e educação e a convivência com a execução de lideranças, ataques a acampamentos e outras agressões por agentes de segurança, ataques a indígenas em situação de isolamento, tortura por policiais federais, suicídios entre outras.
Os casos de violência contra os povos indígenas não cessam. No Relatório, que traz os dados referentes ao ano de 2009, mais uma vez chama atenção a concentração de casos de violação de direitos no Mato Grosso do Sul, especialmente os relacionados ao povo Guarani Kaiowá. No estado, onde vive a segunda maior população indígena do país, mais de 53 mil pessoas, os direitos constitucionais desses povos são mais que ignorados.
Somente ano passado, 33 indígenas foram assassinados no MS, o que representa 54% do total de 60 casos apresentado pelo relatório. Tais ocorrências são caracterizadas pela doutora em Educação Iara Tatiana Bonin como racismo institucional. “A violência sistemática registrada nos últimos anos permite afirma que nesse estado se configura um tipo de racismo institucional, materalizado com ações de grupos civis e omissões do poder público”.
O Relatório ainda aponta a situação conflituosa em que vivem os indígenas no Sul da Bahia. Na região é fácil constatar um crescente processo de criminalização de lideranças e intensificação de ações contra os indígenas. Em 2009, cinco indígenas da comunidade Tupinambá da Serra do Padeiro foram capturados e agredidos durante uma ação da Polícia Federal. Durante a ação eles receberam choques elétricos na região dorsal e genital.
Altos indíces de violência são ainda registrados quando referentes às agressões ao patrimônio causadas pelos grandes projetos do governo federal. As obras vão desde pequenas centrais hidrelétricas a programas de ecoturismo, gasodutos, exploração mineral, ferrovias e hidrovias. Tais projetos impactam territórios indígenas e afetam a vida de diversos povos, inclusive aqueles que têm pouco ou nenhum contato com a sociedade envolvente.
Exemplo de tais obras é a hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. O projeto preconizado pelo governo como sendo fonte de desenvolvimento, na verdade, trará consequências desastrosas e irreversíveis ao meio ambiente e às comunidades da região. Diversos especialistas e movimentos socias já apontaram o número sem fim de irregularidades que envolvem a obra, como o não respeito à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que assegura o direito de oitiva ás populações em caso de obras que lhes afetem.

Metodologia e propósito
A metodologia de pesquisa empregada é a mesma utilizada nos anos anteriores: toma-se como fonte o noticiário da imprensa em jornais, revistas, rádios, sítios virtuais, além dos registros sistemáticos efetuados pelas equipes do Cimi. De acordo com a professora Lúcia Rangel, "não se pode constatar uma tendência de diminuição de conflitos e situações de violência, mesmo que alguns números sejam menores do que os registrados em anos anteriores". Ela ressalta também que o relatório não abarca todos os casos e que são relatados apenas os registros que foram possíveis de se conseguir durante todo o ano.
Assim, para evitar que a realidade de violência contra estes povos se torne algo banal, o Cimi explicita tais agressões para a população, aos organismos de defesa de direitos humanos – nacionais e internacionais - legisladores, juízes, autoridades. E, como afirma Liebgott, a convicção da entidade é que toda esta realidade precisa ser enfrentada e os responsáveis denunciados.

Serviço:
Lançamento Relatório de Violência contra Povos Indígenas no Brasil – 2009
Quando: 9 de julho, às 15h
Onde: Sede da CNBB – Setor de Embaixadas Sul Qd. 801 Conjunto B – Brasília/DF
Informações: Cleymenne Cerqueira - 61. 9979-7059
Contato para imprensa internacional: Paul Wolters - 61. 2106-1666 ou 61. 9953-8959

Fonte: CIMI

quinta-feira, 1 de julho de 2010

A VOZ DO MARAJÓ - ENTREVISTA


Foto:
Paulo Teixeira e Paulo VILLAS-BÔAS Visita planejamento 1a fase Ilha do Marajó Rio Anajobim

ENTREVISTA CONCEDIDA AO JORNAL VIRTUAL "VOZ DO MARAJÓ"
ATRAVES DO JORNALISTA MARCOS MIRANDA.

Segue entrevista por e-mail concedida à Voz do Marajó, por Paulo Celso Villas Bôas, presidente da Expedição VILLAS-BÔAS pelo Brasil e do Instituto Econômico Social e Sustentável do Brasil “Fundação VILLAS-BÔAS”, que gentilmente respondeu às perguntas conforme abaixo:

VM - Como surgiu e qual o propósito das atividades da Fundação Villas-Bôas,
bem como da Expedição Villas-Bôas?
PVBôas – O projeto Expedição VILLAS-BÔAS surgiu do desejo de acompanhar os sertanistas irmãos VILLAS BOAS lá nos idos de 70, pelos sertões do Mato Grosso. Há uns 20 anos atrás o meu saudoso pai me propôs rodarmos o Brasil, partilhando os problemas sociais dos nossos compatriotas, não só dos indígenas, mas dos cidadãos que migram e se estabelecem nessa imensa extensão geográfica que é o nosso país. Hoje não tenho a companhia do meu saudoso pai, mas chegou à hora de colocar em pratica todo esse projeto elaborado e planejado por tantas décadas. Nos objetivos da Fundação consiste a valorização do homem como peça fundamental no meio ambiente com sua necessidade de existência, com foco a política na sua proteção e as legislações, o social e valorização econômica, e o fortalecimento e crescimento de proteção do ecossistema e sua biodiversidade.

VM - Verificamos em seu site que a Expedição estará no Pará e em especial em Marajó ainda neste 1º semestre de 2011. Já existe um plano de ação pré-estabelecido ou isso será inteiramente construído de forma conjunta com as sociedades nativas ou ainda será um misto das duas possibilidades?
PVBôas – Existe logicamente um plano prévio de ação mas que esta sendo reajustado em função da realidade local e que prevê largo espaço para participação das sociedades nativas. Marajó também será contemplada em nossa 2a etapa da expedição pois faremos via fluvial todo o rio Tapajós, subindo pelo Amazonas "desaguando" no Oceano Atlântico passando por todas as cidades ribeirinhas da Ilha do Marajó, chegando nas Ilhas Mexianas e Cavianas, descendo pelas costas do Amapá, quando então seguiremos rumo a Manaus.

VM - Como ou de que forma a FVB pretende ajudar as comunidades contempladas pelo projeto Expedição Villas-Bôas?
PVBôas – Apesar de termos estabelecido nosso roteiro, as comunidades contempladas serão também as que sofrem maiores necessidades, por isso a possibilidade de incluirmos sub-rotas visando atender o maior numero de habitantes possível. Estamos buscando parcerias com órgãos que possibilitem o desenvolvimento de Marajó em longo prazo além dos projetos que pretendemos desenvolver na Ilha quando da estadia das nossas equipes. Temos em nossas equipes renomados cientistas engajados nessa expedição para promover a transferência de tecnologia de profissionais e empresas francesas. O principal cientista e pesquisador é o Prof. Alair Ruellan, que viveu no Amapá, pesquisou os solos da Amazônia Legal, têm estudos e publicações sobre a agricultura sustentável em nossa região e recebeu vários títulos de honoris causa. Nosso projeto é investigativo e o que pudermos fazer para que haja uma transformação nas regiões visitadas, faremos! Essa é a nossa proposta. Não iremos como salvadores da pátria, mas queremos por meio de parcerias fazer uma transformação nessa região, a começar pela mudança de atitudes.

VM - Como pretendem interagir com essas comunidades onde atuará o projeto no sentido de atingir os resultados esperados?
PVBôas – Promovendo cursos profissionalizantes, palestras de conscientização, serviços de assistência básica, seguindo as linhas mestras do conceito socioambiental da FVB e dos planos diretores de todas as cidades e regiões dos municípios do Marajó. E que os políticos, governantes municipais e esfera estadual, saibam dos nossos propósitos, pois estaremos sendo monitorados via satélite. Nossas ações serão visíveis em níveis nacional e internacional. Procuraremos interagir com cada cidadão que nos der ouvido e procurar a melhor forma para que os prefeitos nos escutem e possamos lhes passar soluções, Não poderemos calar, olhar, virar as costas e achar que nossa missão acabou ali. O mesmo faremos com os empreendedores, associações, igrejas de uma forma geral. As verdadeiras razões pelas quais parte da população brasileira não sai da linha baixa da pobreza esta na falta de interação e interesse de alguns.

VM - Sobre a Expedição Villas-Bôas pelo Marajó, especificamente sobre Breves e Portel, tivemos o fechamento das indústrias madeireiras e de Palmito de açaí sem distinção entre quem trabalhava de forma legal/ilegal. Sem julgamento entre certo ou errado, o fato é que esses municípios tinham na extração desses produtos florestais a base de suas economias. Diante da verdadeira criminalização generalizada da opinião pública e do governo contra essa atividade e do consequente engessamento dessas atividades, os habitantes dessas regiões ainda podem visualizar a possibilidade de ter crescimento econômico?
PVBôas - Veja, o nosso país tem passado nessas últimas décadas a maior revolução que se possa imaginar, exposto em nível mundial pelo problema da conservação da floresta e sendo detentor da maior floresta tropical do planeta, fica à mercê de pressão internacional produzindo às pressas leis por muitas vezes unilaterais sem apresentar solução para os problemas que cria quando da execução das mesmas. Aos habitantes de Marajó será dada a oportunidade de desenvolverem sua economia e consequentemente fazerem parte dos mercados de trabalho e comercialização de produtos sob o regime legal atual, dentro da Ilha. Marajó tem um grande manancial de oportunidades e nosso "papel" é viabilizar possibilidades de crescimento.

VM - Ainda sobre o fechamento dessas indústrias nesses dois municípios evidentemente tivemos impacto social enorme: mais de 11 mil desempregados, aumento em índices de problemas preexistentes como a criminalidade, a pedofilia, etc. Que tipo de ações o Fundação Villas-Bôas poderia desenvolver no sentido de buscar melhorias para esses problemas específicos?
PVBôas – Sozinhos nada faremos, são políticas publicas que terão que ser discutidas, isso é um problema de governo, vocês sabem muito bem disso, seria hipocrisia de nossa parte falar que iremos reverter essa situação, mas estaremos interagindo de toda a forma com a coletividade local. Virão para a Ilha do Marajó, cientistas, pesquisadores e profissionais de diversos seguimentos da França que se unirão com nossos profissionais e ONGs genuinamente brasileiras, pois não aceitaremos estarem conosco ONGs internacionais. Essas, as nacionais, por acordo firmado com a FVB irão transferir tecnologias, conhecimento do que lá esta dando certo, formaremos lideres para serem multiplicadores de propostas para profissionalização dessas pessoas que só souberam fazer só uma atividade, faremos isso nas dependências de prédios públicos se deixarem, se não nós faremos em associações, dentro das igrejas, e se tudo isso faltar faremos em baixo de tendas e se não tivermos respaldo de ninguém para essa mudança comportamental, estaremos como disse antes, sendo monitorados por satélite, o Brasil saberá o que estamos fazendo e o que esta acontecendo. Na internet não existe rua ou distancia, o mundo inteiro estará nos acompanhando, o nosso portal é visto em mais de 78 países.

VM - Além do recente agravamento do problema econômico em Marajó, temos uma causa aparente que persiste desde a colonização: a fragilidade dos governos municipais e estadual no quesito "know-how"(saber fazer) para buscar soluções para os diversos problemas já mencionados em questão anterior(saúde, educação, prostituição infantil, etc.) Diante do quadro, de que forma o Instituto poderia interferir?
PVBôas - Quero enfatizar mais uma vez, problemas de governo, teremos que mostrar ao governo o que ele não vem fazendo até agora, o que é comum é discutir em salas refrigeradas de paletó e gravata importando-se com as ações no papel, mas eles sabem da situação desse povo sofrido, falta é saírem dessas salas, tirarem as gravatas, pegarem uma "voadeira" e sentirem o problema “in-loco”. Somos do terceiro setor, o terceiro setor é o terceiro segmento da sociedade que coloca o dedo na ferida e até ajuda o primeiro setor naquilo que ele não faz. O nosso projeto não é pontual, não fincamos na mente que o povo tem que plantar macaxeira, ou vamos tratar de dentes nas populações visitadas, isso é assistencialismo! Em nosso estatuto ela é macro, a nossa proposta estatutária vai de encontro com educação, saúde, desenvolvimento sustentável, pois achamos que a iniciativa privada tem que marcar seus territórios para uma produção sadia e dentro da lei. Estimulamos a discussão do Zoneamento Econômico Ecológico, a erradicação da pobreza, priorizando o desenvolvimento humano nas diversas regiões do país, baseando-nos no respeito à natureza. Queremos contribuir para a redução da mortalidade infantil. Estamos fazendo parcerias com ONGs como a Sarapó, do amigo Cirurgião Plástico Dr. Cláudio Brito que vem há anos lutando com o famigerado problema da proteção dos eixos das embarcações que é comum na região, com o mínimo de sucesso, ele fez muito, mas pela gravidade do problema ainda é muito pouco. Da França virão materiais cirúrgicos, perucas especiais para levantar a auto-estima dessas crianças e senhoras que tiveram seus cabelos longos um dia. Por questões que não discutimos, pois não estaremos julgando conceitos religiosos, o fato dessas pessoas não cortarem seus cabelos transforma suas vidas em catástrofe. Teremos ONGs na área de saúde preventiva onde o conceito é orientar essas pessoas a mudarem hábitos alimentares, de higiene para não pegarem e transmitirem doenças. Com relação à segurança da população, sabemos que só se pode inverter o quadro com estimulo a produtividade, com geração de empregos, educação e renda familiar condizentes para o sustento de sua família. Somos contra o engessamento Amazônico, contra os ativistas radicais que olham nossa floresta como santuário ecológico. Só sairemos da miséria com agricultura forte. As federações do Estado do Pará receberam documento falando dos nossos propósitos e os convidamos a apoiarem essa "campanha" de mudança de comportamento, de uma forma responsável para buscarmos soluções para esse caos em que vivem os marajoaras. Somente unidos poderemos fazer com que a população tome uma atitude cobrando dos seus governantes ações pontuais. Nesse ponto quero me curvar à iniciativa da governadora que instituiu o Fórum Social de Competitividade, mas infelizmente as coisas so mudam quando se tem voz e representatividade, é o que os excluídos dessa ilha têm que fazer. Vamos formar lideres de associações, sejam eles extrativistas, de agricultura, turismo, etc. Os Marajoaras precisam ter representatividade e precisam saber exigir mudanças nas normatizações, decretos para que haja uma inversão radical, dessa forma é que deixaremos de ter violência, bandidagem, rota de trafico, prostituição. Os cegos têm mais percepção para verem esses problemas do que certos políticos que somente em época de eleição enxergam os problemas de um povo.

VM - Em entrevista recente do ambientalista Giovanni S. Junior do Instituto Chico Mendes ao VM, o mesmo nos informou que o ICMBio já vem desenvolvendo, de forma inicial, trabalhos no sentido de legalizar e permitir a extração de recursos florestais (caça, pesca, extração de madeiras, açaí, etc.) para subsistência e de forma racionalizada sendo que, no início da implantação das resex's, estas haviam sido proibidas. Visto que essas ações do ICMbio ainda estariam em fase inicial, caberia aí uma parceria entre as duas entidades no sentido de se dar celeridade ao processo já iniciado pelo ICMbio?

PVBôas - Não temos essa informação, vamos nos inteirar, como lhe disse estamos abertos a todas as instituições que queiram unir forças, sozinhos não seremos ninguém, agora com muitos faremos um grande projeto. Estará em nosso portal (www.expedicaovillasboas.com.br) o Edital convidando todas as organizações do terceiro setor e profissionais qualificados a enviarem projetos. Selecionaremos os mais impactantes e que façam a diferença para esse estado de emergência que atravessa a Ilha do Marajó.

VM - Então podemos considerar que a Expedição também poderá admitir parceiros locais como empresas, sindicatos, Igrejas, poder público ou voluntariado em geral?
PVBôas - Toda ajuda será bem vinda, sem esses agentes citados na sua pergunta seremos "meros" turistas, isso não queremos ser. Não temos a pretensão de sermos recebidos com bandas de musica ou tapetes de flores, não estamos preocupados com fidalguias, mas também não somos "masoquistas", e queremos o apoio de todos os marajoaras para receberem uma expedição que quer fazer a diferença.

VM - Nas parcerias com empresas, poderá haver também preparação de comunidades para utilização de crédito rural voltado à agricultura familiar como o Pronaf floresta ou o Pronaf Mulher, através de convênio com bancos gestores dos recursos?
PVBôas - Todos as entidades receberam instruções de como proceder, enviamos carta ofício ao SEBRAE–Pa, aos bancos oficiais para estarem juntos conosco, só não podemos garantir a vontade alheia. Esperamos sim que tenhamos respaldo de tudo e de todos, para alavancar o progresso dessa região.

VM - Verificamos em seu site a existência de rotas geográficas onde atuará a Expedição Villas-Bôas. Poderão ser incluídas sub rotas, por sugestão das comunidades ou parceiros, por exemplo?
PVBôas - Quando fizemos nossa rota, elaborada a quatro mãos, não estávamos in loco. Nossa intenção é sermos eficazes e dinâmicos e que a logística seja viável no que concerne o percurso para essas subrotas. A Ilha do Marajó é muito atípica, vamos precisar de ajuda de quem vive na região e ajudar-nos com critérios, com uma rota mais produtiva e em que condições faremos tudo isso.

VM - Concluídas as chamadas etapas iniciais, por quanto tempo ainda estarão
acompanhando os resultados das ações tomadas junto com as comunidades? E de que forma isso será possível em uma área continental como é a brasileira?
PVBôas - Vamos concentrar todas as demandas em nosso escritório - cérebro desse mega projeto. É lá que serão articuladas as decisões com todas os envolvidos no processo: governo, área cientifica, empresários. Todos a quem possamos chamar atenção e buscarmos respostas concretas para esses problemas. A população brasileira não pode ficar inerte e amordaçada. Digo sempre, não seremos os salvadores da pátria, mas gostaríamos de ser proativos, responsáveis e "dentro da lei" para fazermos a diferença.

VM - Agora que temos a idéia do que é a Expedição Villas-Bôas e dos objetivos de tamanho projeto, gostaríamos de sua descrição do que seria dizer que a FVB cumpriu sua missão.

PVBôas - Não! So daremos nossa missão por comprida, quando tivermos um país sem miséria, sem fome, independentemente do nível escolaridade (seria o maior investimento que um país poderia fazer). A Expedição terá dado abertura ao projeto paralelo - Projeto Brasil. Como funciona? Primeiro deixe contar um fato histórico que todos falam, mas sem conhecimento; A África dos 100% de floresta hoje mantém 7,8% de sua cobertura florestal, a Ásia 5,6%, a America Central 9,7 % e a Europa, é o pior caso no mundo, apenas 0,3%, diz o pesquisador da Embrapa Evaristo Eduardo de Miranda, não é possível ignorar que 99,7% das florestas primárias européias foram substituídas por cidades, cultivos e plantações comerciais. Os países que hoje mais poluem são o EEUU, China e a Índia. Todo o planeta depende da conservação de nossas florestas para o presente e o futuro. Conclusão. Os países poluidores e ricos terão que pagar alto para que isso aconteça. Vários países já destinaram dinheiro para essa questão ambiental, no ano passado a Noruega destinou um milhão de dólares para projetos de conservação. Muito bem, isso não resolve o nosso problema, não é investido onde queremos que é na floresta, que é no reflorestamento. Nossa proposta, é que o governo faça essa captação de dinheiro internacional a fundo perdido, e aplique no setor produtivo onde todos com um só interesse destinem o dinheiro para o reflorestamento, permitindo qualquer um pedir financiamento. Vou explicar como funciona. Fazendeiros, sejam pecuaristas ou do agronegócio, que na década de 60 e 70 que tinham que desmatar 50% das suas áreas incentivados pelo governo federal (muitos desmataram mais do que isso) terão que reflorestar suas áreas para obterem seus produtos liberados para comercialização nacional e internacional, o ruralista, seja ele pecuarista ou do agronegócio que desmatar mais de 80%, a cada hectare derrubado plantará 10 hectares na sua propriedade ou em áreas alteradas ou degradadas. Desta forma não haverá falta de financiamento para agricultura e não haverá descontentamento desse setor, reflorestarão com árvores nativas e frutíferas, os países ficarão satisfeitos com os produtos comprados com todos os alimentos consumidos certificados e com o selo verdadeiramente ambiental. O madeireiro a cada hectare derrubado com manejo florestal, terá que plantar três hectares, e a silvicultura dos 100% que certamente cortarão, os obrigarão a plantar 6 hectares e assim por diante... Vejam o lucro real onde todos terão interesse, os ribeirinhos, os indígenas, quilombolas, o povo da floresta terá seu rendimento, pois terá que colher sementes, fazer viveiros, e reflorestar, com apoio tecnológico de engenheiro, florestal, agrários, geólogos, e muitos outros profissionais que estarão envolvidos no processo, ganha a cidade, o comercio, o turismo, toda a sociedade. Com isso temos a certeza de ganho real: cursos de artes e ofícios, inclusão digital, culturas certificadas para atenderem demanda interna e exportarem seus produtos. Com o projeto que propomos, o mundo voltará os olhos para Amazônia, mas com outra ótica. Portanto, o mundo não está "de olho" no desmatamento no país, esta "de olho" sim é no estoque que temos em minérios, plantas medicinais, madeira, e na terra fértil que temos com potencial para alimentarmos o mundo. O objetivo é captar esses recursos para reflorestarmos a Amazônia com Responsabilidade Sócio-ambiental. Não será difícil para o governo brasileiro captar esse dinheiro, pois haverá argumento substancial. O empresariado em todos os seguimentos e o pequeno agricultor que as duras penas mal consegue manter-se no campo, que dirá reflorestar suas terras, poderão receber recursos para sua legalização e continuar na sua luta pela vida. Dessa forma haverá interesse dos grandes empreendedores do agronegócio, como nos permitirá, também, fazer uma política mais séria e de sustentabilidade técnica para a agricultura familiar e, como disse nas primeiras respostas, garantir emprego e cidadania em todos os sentidos.
Só acreditaremos em desenvolvimento sustentável, quando passarmos a limpo a nossa história, respeitando o próximo de forma digna e que esses se transformem em cidadãos de fato e de direito. Hoje pessoas que são vistas como estorvos ou como problemas, ficando à sorte em que Deus proverá.
Só haverá desenvolvimento sustentável, quando todos saírem ganhando, o setor produtivo, o meio ambiente e o homem. A isto chamamos tripé sustentável.

Fonte: Fundação Villas-Bôas