quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Violência contra os povos indígenas no Brasil segue alta em 2015, aponta relatório

Segundo organizador do documento, média de assassinatos é de 55 pessoas por ano nas últimas décadas Foi lançado no último dia 15 o relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil – Dados 2015, compilado e publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI). O documento contém dados alarmantes sobre homicídios, suicídios, mortalidade infantil e ameaças de morte além de outros tipos de violência enfrentados cotidianamente pelas populações indígenas nos estados brasileiros.
Os homicídios, ataques, ameaças de morte, espancamentos, bem como a violência por omissão à assistência, de modo geral, mantiveram a média de índices altos. Só em 2015, 137 assassinatos de indígenas foram reportados. Destes, 36 aconteceram no Mato Grosso do Sul, estado em que também ocorreram 45 dos 87 suicídios registrados no ano passado. Na avaliação de Roberto Antônio Liebgott, um dos organizadores do documento e coordenador da regional sul do Cimi, o estado do Mato Grosso do Sul vive a violência de forma permanente na disputa de fazendeiros pelos territórios tradicionais indígenas, enquanto em outros estados as violações podem variar. “Em 2015, o Maranhão se destacou pelas situações gravíssimas de incêndios criminosos por madeireiros, e a Amazônia na desassistência e precariedade da fiscalização”, explica. Para a coordenadora da pesquisa, a antropóloga Lúcia Helena Rangel, os dados ainda não abrangem a real gravidade da situação. “Temos poucos casos de racismo, mas a gente sabe de mais histórias. É o racismo que leva alguém a se sentir no direito de matar uma criança no colo da mãe, por exemplo”, afirma, em referência ao assassinato do menino Vitor, indígena do povo Kaingang de apenas 2 anos, morto em dezembro do ano passado no município de Imbituba, Santa Catarina. Denuncias levadas à ONU Na última quarta-feira(21), o relatório foi apresentado em evento paralelo na ONU com a presença de lideranças indígenas, da Relatora Especial da ONU para direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz e do procurador do Ministério Público federal de Dourados (MS), Marco Antonio Delfino, além da mediação de Ana Maria Suarez-Franco, da Fian International. No dia anterior, as denuncias sobre as violações aos direitos dos povos indígenas no Brasil apresentadas na 33ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (UNHRC) pela Relatora Especial, Victoria Tauli-Corpuz, foram ignoradas pela embaixadora Regina Maria Cordeiro Dunlop, representante do governo brasileiro na ocasião. Fonte: Letícia Leal

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Documentos da Cruz Vermelha revelam quase "extermínio" de indígenas na ditadura

Num estado de saúde deplorável, aniquilados por doenças, uma miséria profunda e trabalhando como escravos para fazendeiros, povos indígenas inteiros estiveram próximos de desaparecer no final dos anos 60 e início da década de 70. Isso é o que revelam informes confidenciais preparados pelo CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha) e que estiveram guardados por quase meio século de forma sigilosa em Genebra. Alguns povos passaram a praticar abortos diante da constatação de famílias de que não teriam como garantir a sobrevivência da nova geração. A entidade, depois de uma intensa negociação com o governo militar brasileiro, foi a primeira organização internacional a sair ao resgate dos índios da Amazônia, num momento que jornais e especialistas estrangeiros apontavam para um "genocídio" na floresta brasileira. A reportagem teve acesso a centenas de páginas de documentos dos arquivos do Comitê Internacional da Cruz Vermelha que, de forma inédita, apresentam detalhes do regime militar brasileiro entre 1965 e 1975. Os arquivos estavam fechados até este ano. O que os documentos revelam é, acima de tudo, a miséria de um grupo cada vez mais pressionado por interesses econômicos e sem contar com a assistência da Funai (Fundação Nacional do Índio), considerada pelo CICV como "incapaz" de lidar com a crise. Os alertas para a entidade começaram a chegar na primeira metade ainda dos anos 60, com especialistas europeus denunciando a crise. Os capítulos nacionais da Cruz Vermelha na Alemanha e nos países nórdicos também pressionaram e indicaram que estavam dispostos a financiar uma ação na Amazônia. Mas o CICV levaria anos para agir. Primeiro, por alegar que jamais tomaram uma iniciativa similar. Quando optou por se lançar na operação, já em 1969, teve então de superar a resistência do governo brasileiro. Na época, o então ministro do Interior, José Costa Cavalcanti, aceitou a missão, com o compromisso de que fosse puramente humanitária e que resultasse em uma ajuda real. Ele, porém, negava qualquer ato deliberado das autoridades em promover um massacre, tese divulgada naquele momento pela Europa. Foi finalmente em 1970 que uma missão foi enviada ao Brasil, liderada pelos delegados Bo Akerren, Sjouke Bakker e Rolf Habersang. Em pouco mais de três meses, eles visitaram 20 povos e 30 vilarejos, tendo acesso ao que acreditam ser um terço da população indígena da Amazônia Legal naquele momento, avaliada em cerca de 70 mil. Reprodução/Agência Pública Capa do relatório da Cruz Vermelha sobre a situação dos indígenas na Amazônia Os delegados, em suas conclusões, disseram claramente que "não entrariam na questão se há ou não um genocídio". Mas foram taxativos: se nada for feito de forma rápida, "não haverá mais o problema indígena para resolver". Para chegar a essa constatação, o grupo percorreu uma trajetória que se confundia com o percurso do abandono de populações inteiras pelas autoridades. No dia 17 de maio de 1970, o diário da viagem dos delegados conta como na aldeia Santa Isabel, com 250 índios Carajás, a malária tracoma e gastroenterite dominavam o local. Mas o destaque foi o "baixo padrão de higiene, agravado pela presença de muitos cachorros que poderiam ser fonte de tuberculose". No dia seguinte, a duas horas dali em barco, uma outra aldeia foi descrita como tendo um "padrão muito baixo de higiene, pessoas e local sujos" e uma epidemia de influenza, pneumonia combinada com malária e tuberculose. "Essa aldeia Carajás deu a impressão de estar totalmente negligenciada e apática". No dia 27, a visita a uma aldeia Kanayurá encontrou uma população "muito pobre", com a presença de bronquite, casas "muito dilapidadas" e mulheres e crianças "magras e fracas". Alguns dias depois, entre os Bororo no Mato Grosso, a delegação deparou com uma situação de " extrema pobreza", anemia severa e com 15% da população sofrendo com tuberculose. "A tribo está rapidamente em declínio em números por conta das doenças, alimentação inadequada e completa ausência de ajuda médica", alertou. "A falta de ajuda vai logo levar à extinção dos Bororos", indicou a delegação. No dia 1 de junho, numa visita a um ambulatório da Funai nas proximidades de Cuiabá, a delegação foi informada que o estado do Mato Grosso tinha apenas 50 camas para tratar tuberculose e com longas filas de espera. "As chances dos índios serem internados eram praticamente zero", constatou. Abortos frequentes Uma visita ao Seringal do Faustino, 60 km de Vilhena na direção de Porto Velho, também deu a dimensão da crise no dia 5 de junho de 1970. Numa aldeia Nambiquara, entre doenças e desnutrição, os índios apenas comiam "ocasionalmente algum arroz de um fazendeiro que queria que eles trabalhassem". "Todos são obrigados a trabalhar para o fazendeiro, uma espécie de chefe local que os mantinha mais ou menos em um estado de completa dependência, dando algum arroz de tempos em tempos e ocasionalmente alguma roupa", disse. "As mulheres não querem engravidar, pois temem perder os filhos diante do trabalho duro que tem de fazer e do temor de não poder cuidar", apontou. O resultado eram abortos frequentes e, portanto, um estagnação na população da aldeia. O risco de extinção ainda foi apontado na aldeia de Capitão Pedro, 50 quilômetros de Vilhena na direção de Cuiabá. Segundo o informe, um grupo de Nambiquaras estava em uma "situação verdadeiramente desesperadora e se ajuda não for dada, a aldeia provavelmente desaparecerá completamente". Não distante dali, a delegação constatou que sete pessoas de um grupo de cem índios tinham morrido de sarampo em três semanas. Outros 20 estavam doentes. Em Feijoal, duas horas de barco de Belém, os Ticuna estavam em uma situação "realmente miserável". No posto da Funai de Mãe Maria, uma hora de Marabá, um outro grupo de 46 índios tinha apenas farinha para comer. "Esses índios estavam no estado mais deplorável que encontramos em termos de saúde", disse o informe. "Homens e mulheres estavam muito doentes", contou, apontando que eles haviam sido transferidos de suas terras diante da construção da rodovia Belém-Brasília. Em agosto, um grupo Kayapó Xikrin, uma hora de Marabá, constatou que, alguns anos antes, uma epidemia de pólio matou um terço da aldeia, com cerca de 50 vítimas. Risco do contato Reprodução/ Agência Pública Índios Nambiquara pelas lentes do antropólogo Claude Levi Strauss Diante das constatações e das visitas, os delegados do CICV chegaram à conclusão de que os povos mais isolados são aqueles que estavam em melhor situação em termos de saúde. "Índios isolados em seus habitats podem ser considerados como estando melhor adaptados e em equilíbrio com o meio ambiente", indicou a missão. Teria sido o contato com a "civilização", na maioria dos casos, que teria levado grupos inteiros a viver uma situação de risco. Como recomendação, o CICV sugere que os novos contatos fossem feitos de forma "cuidadosa". "Eles (índios) são tirados do equilíbrio em contato com outras civilizações, como a nossa", explicaram. Esse contato poderia levar a "novas infecções, novos hábitos de alimentação, estrutura social, novos sistemas de valores". "Quanto mais rápido e sem controle (ocorrer) o contato, maior o risco de os índios sucumbirem, não apenas como membros de uma entidade tribal, mas também como seres humanos", constatou. Nos meses que se seguiram à missão, a entidade montou um amplo plano de entrega de remédios e alimentos na região, num esforço para evitar que a população indígena fosse dizimada. Mas ela também constatou que não havia dúvidas de que, nos anos seguintes, a sociedade brasileira iria "forçar seu caminho a novas áreas e esses índios vão estar ainda mais pressionados". Quanto à Funai, seus recursos seriam "insuficientes" para lidar com a crise. Uma avaliação que, 46 anos depois, provaria certeira ao ponto de uma recente relatora da ONU para o direito dos povos indígenas, Victoria Tauli Corpuz, adotar o mesmo tom em relação à pressão que grandes obras de infraestrutura podem gerar na demarcação de terras. "Informações apontam para uma regressão preocupante na proteção dos índios", afirmou. Ela ainda completou sua avaliação com uma constatação: "o país tem uma dívida histórica com os povos indígenas, que sofreram a marginalização desde a formação do Estado". Dívida essa que continua sem ser quitada. Fonte: Agência Pública

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

As 10 mentiras mais contadas sobre os indígenas - parte 1

As afirmações listadas abaixo foram extraídas da vida real. Algumas nas ruas do interior do Brasil, outras nas cidades grandes, outras em discursos de políticos. Percepções diversas, vindas de pessoas com histórias diferentes, mas com um direcionamento em comum: a disseminação do discurso anti-indígena com argumentos falsos. Mentira nº 1: Quase não existe mais índio, daqui alguns anos não existirá mais nenhum Se as pessoas não sabem muito sobre os indígenas na atualidade, sabem menos ainda sobre o passado destes povos. Mesmo os pesquisadores não encontram um consenso, e os números variam muito conforme os critérios utilizados. A antropóloga e demógrafa Marta Maria Azevedo estima que, na época da chegada dos europeus, a população indígena no Brasil era de 3 milhões de pessoas. Eram mais de 1.000 povos diferentes, que durante séculos foram exterminados pelos conquistadores, seja por suas armas de fogo, seja pelas doenças que eles trouxeram. De acordo com antropóloga, em 1957 havia no Brasil apenas 70 mil indígenas. O crescimento desta população é observado somente a partir da década de 1980. Em 1991, quando o IBGE passou a coletar dados sobre a população indígena brasileira, eles somavam 294 mil pessoas. Em 2000, o Censo revelou um crescimento da população indígena muito acima da expectativa, passando para 734 mil pessoas. Em 2010, a população indígena continuou crescendo, e o Censo mostrou que mais de 817 mil brasileiros se autodeclararam indígenas, representando 0,47% da população brasileira. Eles estão distribuídos em 305 etnias e falam 274 línguas. Esse aumento populacional jamais seria possível se fossem considerados apenas fatores demográficos, como a natalidade e a mortalidade. Esses dados revelam o crescimento do número de pessoas que passaram a se reconhecer como indígenas e o “ressurgimento” de grupos indígenas. Isto se dá porque, antes, ser índio no Brasil significava ser atrasado, inferior, escravizado, catequizado, ser alvo de discriminação, de chacinas e até mesmo não ser considerado humano. Diversos povos foram obrigados a abrir mão de suas línguas e de sua cultura. Agora os povos indígenas voltam a afirmar sua identidade, talvez porque as circunstâncias estejam mais amigáveis. Ou talvez porque este grito não suporte mais ser calado. Tratá-los simplesmente como “índios” esconde a imensa diversidade cultural e circunstâncias de vida tão distintas. Mas algo muito mais forte que as diferenças étnicas propicia a união destes povos: o fato de se sentirem diferentes de nós. Temos no Brasil todos os tipos de extremos: índios que possuem seu território assegurado e índios que morrem lutando por seu território; índios brancos e índios negros; índios cristãos e índios pajés; índios isolados e índios urbanos. Os povos indígenas isolados são aqueles que não estabeleceram contato permanente com a população nacional e com o Estado. As informações sobre eles são transmitidas por outros índios, por moradores da região e por pesquisadores. A Funai (Fundação Nacional do Índio) tem cerca de 107 registros da presença de índios isolados em toda a Amazônia Legal, dos quais 26 já foram confirmados e estão sendo monitorados, seja por imagens de satélite, sobrevoos ou expedições na região. Não se sabe, no entanto, a quantidade destes povos e indivíduos que vivem voluntariamente isolados. Muitos já tiveram alguma experiência de contato não amistosa com garimpeiros, madeireiros, grileiros e traficantes próximos à fronteira. Também é provável que tenham tido ou mantenham contato com populações ribeirinhas, seringueiros e, principalmente, com algum outro povo indígena. Os resultados do contato conosco são trágicos, a começar pelas doenças que transmitimos, para as quais eles não têm imunidade: sarampo, rubéola, caxumba, difteria, tétano, hepatite, gripe e outras. Conhecendo esta realidade, estes povos que vivem em situação de isolamento escolheram fugir. Isso não significa, no entanto, que eles não tenham notícias de nossa sociedade. Eles observam rastros, utilizam ferramentas e se relacionam com outros indígenas que contam as novidades do mundo do branco. Em outros tempos, como muitos devem se lembrar, o órgão governamental indigenista, na época chamado SPI (Serviço de Proteção aos Índios), deixava presentes como espelhos, panelas e ferramentas para atrair os indígenas. Hoje a Funai busca garantir que eles tenham seu território assegurado para transitarem livremente. Mas as ameaças são muitas e cada vez mais seus territórios são menores. Os indígenas que vivem em áreas urbanas somam 324 mil, ou seja, 36% do total da população indígena, um número que vem crescendo ano após ano (IBGE, 2010). Há dois motivos recorrentes para que esses índios vivam em áreas urbanas. Um deles é a migração dos territórios tradicionais em busca de melhores condições de vida na cidade. O outro é que os limites das cidades cada vez mais alcançam as fronteiras de seus territórios. As pessoas continuam acreditando que a população indígena está sendo reduzida, mesmo que os números digam o contrário e que eles estejam mais presentes nos centros urbanos. A desinformação tem uma consequência: fingimos que os índios estão deixando de existir e gradualmente não pensamos mais na situação deles. Assim fica mais fácil justificar nenhum respeito a seus direitos e à sua própria vida. Por Lilian Brandt* / AXA

Assembleia Kinikinau: Estado brasileiro precisa resolver o "crime que ele mesmo cometeu"

Mais de 300 indígenas exigiram a demarcação imediata da terra indígena Kinikinau, localizada na região do Pantanal do Mato Grosso do Sul, durante a 3ª Assembleia do Povo Kinikinau. Acolhidos pelos Terena da terra indígena retomada Mãe Terra, localizada no município de Miranda (MS), os indígenas Kinikinau - a única população do estado completamente "sem terra" - se reuniram entre os dias 13 e 16 com lideranças Terena, Kaiowa, Guarani e Kadiweu, apoiadores, organizações indigenistas e Ministério Público Federal (MPF). Em documento final, as lideranças acusaram o Estado brasileiro de ser responsável pela presença de fazendas nas terras tradicionais Kinikinau, e reivindicaram a criação de um Grupo de Trabalho (GT) para identificação da terra indígena. A ausência de um representante da Fundação Nacional do Índio (Funai) também foi criticada pelos indígenas. Marco temporal A carta também convocou indígenas do estado e do país a combater a utilização do marco temporal pela Justiça Federal na suspensão de demarcações de terras indígenas. Segundo o documento, o "marco temporal decreta a guerra civil entre os indígenas e os brancos, e isto precisa ser evitado". Para o marco temporal - derivado de uma condicionante de 2008 o Supremo Tribunal Federal (STF) relacionada à terra indígena Raposa-Serra do Sol -, só pode é reconhecida como terra indígena áreas que estivessem efetivamente ocupadas pelos indígenas no exato momento da promulgação da Constituição Federal, em outubro de 1988. O dispositivo jurídico preocupa os Kinikinau, já que eles não estavam ocupando suas terras originárias naquele período. "E nem tinha como estar", contrapõe o cacique da aldeia São João, Crisanto Roberto. "Como estamos agora, o povo Kinikinau? Estamos espalhando por todo Mato Grosso do Sul: nos Kadiweu tem, nos Terena tem, em Campo Grande tem, em Dourados tem. Fomos expulsos antes, com a guerra, com a venda das terras para virar fazenda. Aí saímos caminhando espalhados. Agora, nós queremos juntar de novo". Já utilizado no Mato Grosso do Sul para suspender a demarcação de duas terras indígenas Guarani-Kaiowa e uma Terena (além de mexer com a terra indígena Porquinhos, no Maranhão), o marco temporal é o maior inimigo dos povos indígenas no presente momento, segundo a liderança Kaiowa Elizeu Lopes. Acompanhado por uma delegação expressiva de outros cinquenta Guarani e Kaiowa do sul do estado, Elizeu foi categórico: "não podemos aceitar nada que é contra os nossos direitos, que é contra a Constituição. Nem marco temporal e nem compra de terras, porque nossa terra é tradicional, não está a venda", referindo-se a uma possível proposta do governo de comprar e titular terras aos indígenas, em detrimento do processo constitucional de demarcação. Retomada ou demarcação "O governo sempre quer fazer estratégia pra parar demarcação", explica o cacique de Mãe Terra, Zacarias Rodrigues, "porque aí ficam mais tempo na terra, usando pro gado, acabando com as matas, com o rio". Zacarias é, ele próprio, Terena e também Kinikinau, e defende a retomada como método de garantir o retorno às terras indígenas ocupadas por fazendas."Faz 11 anos que estamos aqui na Mãe Terra, que foi retomada. Tudo o que tem aqui foi nossa luta. A terra, escola, energia, água... Foi muita pressão". Tratados a mais de um século "como forasteiros", os Kinikinau pretendem retornar a sua terra tradicional. "Queremos crer no bom senso dos agentes do estado", argumentam os indígenas na carta, mas afirmam que se não forem dados passos reais para a demarcação - uma reunião com Funai e Ministério da Justiça para a criação do GT -, estão dispostos a "unir forças com os parentes de outros povos e partir para a retomada de nossa terra ancestral nem que tenhamos que morrer por isso". Por Ruy Sposati, da Assessoria de Comunicação do Cimi/MS | Fotos: Ana Mendes/Cimi,